sábado, 18 de outubro de 2008

Manual “Como voltar a ser solteiro de forma rápida, prática e indolor” (eu espero)

Uma das desgraças de voltar a ser solteiro é que de repente, tudo que antigamente era super natural e agradável se torna estranho como se fosse uma primeira vez. Por fora você faz de conta que não é nada mas no seu íntimo rola uma explosão de sensações, medos e inseguranças que você até conhece bem, são parecidos com aqueles que você sentiu pela primeira vez que fez cada uma dessas coisas. A verdade é que você está passando por uma mudança. A coisa não é simples como você-solteiro-agora igual a você-antes-do-relacionamento. Se for, se preocupe. Isso é um sinal de que você não está crescendo nada como ser humano e viver a vida a esmo é uma merda. A primeira balada: Pela primeira vez em muito tempo você sai sem ter que se preocupar com um outro que não está ali e que pode estar se preocupando com você. Saída sozinha de pessoa namorando é uma atitude de observador. Um observador que muitas vezes recebe ligações no decorrer da noite e que acaba sempre com um desejo inacreditável de voltar pra casa. Eu, como namorava a distância, direto saía sozinha, mas é um acontecimento absolutamente diferente de sair sozinha solteira. O primeiro ponto é que, solteira, não dá vontade nenhuma de voltar pra casa. A observação deixa de ser fruto de uma simples curiosidade pra se tornar uma procura. Não necessariamente a procura por alguém, ou por alguma ação entre você e outro alguém, mas uma procura por diversão, tenha ela a cara que for. Minha primeira saída foi uma ótima oportunidade, aniversário de uma amiga querida num bar que eu gosto muito e com pessoas muito agradáveis. Até aí tudo fluiu lindamente, falei merda como antigamente, fiz todas as piadinhas de cunho sexual que passaram na minha cabeça (coisa que eu segurava horrores enquanto não-solteira), me diverti enfim. O problema foi a esticada praquela-boate-que-inaugurou-enquanto-você-namorava e que você não tinha se interessado em conhecer. No auge da madrugada amiga também recém-solteira dando Pit e chilique por querer ligar pro ex dela depois do álcool, saio correndo pra dentro da boate com o celular da amiga, erro a porta, danço um pouquinho, “aqui só tem gay e casal”, o Dj é horrendo, o lugar é legal, “tá bom vambora”. O saldo final até foi bom, a noite foi satisfatória e eu saí pensando “Ah vá! É até bom ser solteira!”. Até o dia seguinte… A primeira festa mais familiar: Não é exatamente um lugar pra se conhecer pessoas, você tem que ficar feliz com os conhecidos que encontra por lá. E quem eu encontro? Duas amigas, uma, a mesma da noite anterior, que voltou com o ex que é uma pessoa detestável e a trata super mal, a outra era uma que também tinha voltado com um ex detestável que a trata super mal. O que pensar? “Pô, meu ex nem era tão mal assim comigo, por que mesmo eu terminei com ele?” A bregueira no ar, Falamansa tocando, e “doeu, doeu, agora não dói, não dói, não dói”, lágrimas. Será que não dói mesmo? Será que eu sou uma pessoa horrível, ultra-exigente, que vai acabar sozinha com um cachorro? execrada pela sociedade? Será que eu fui injusta com aquele cara que era um lorde inglês perto desses dois idiotas que minhas amigas escolheram pra elas? Fugi pra falar de arte abstrata com uma amiga meio aérea. Foi um belo monólogo. Bebi vinho até não ter mais. O telefone toca. “Meldels! É ele dizendo que retira todas aquelas coisas horríveis que disse e que nós vamos ficar juntos de novo e ter filhos lindos!!!” Não era. Era um moço que queria confirmar nosso date do dia seguinte. Menos mal, vamos sair sim, liga amanhã que eu te encontro onde você achar melhor, beijotchauficabem! O primeiro date: Dates são uma coisa MEDONHA. Dates são encontros com pessoas que a gente não conhece muito bem e decide correr o risco de ficar a noite toda sentada numa mesa conhecendo. Dates têm dois lados, podem ser excelentes e podem ser um pesadelo. Ainda mais que esse date específico era quase um blind date. Só tinha visto uma ou outra foto do moço, a recíproca era verdadeira, e tudo isso age em prol de causar calafrios de tensão. Marcamos em um bar que eu nunca tinha ido, pra tomar vodkas de tangerina. Bar grande, cheio, me sentia ridícula com meu sobretudo italiano mas o ex levou a jaqueta de couro de herança e fazia frio demais, “procura uma menina com a camiseta do Punisher, só pra ter certeza que, caso nos percamos, seja proposital”, uma mãozinha se levanta na multidão. Moço de bela figura, escritor, cara de escritor, visu de escritor, papo de escritor e alma de artista. Identificação e simpatias imediatas. Inteligente, culto, conversas que há muito eu não tinha. Sem querer cuspir no prato que eu comia (e ô, como comia com gosto) mas gente com alma de artista atinge níveis de conversa impressionantes comigo. Normalmente isso é uma tremenda preliminar pra mim, é começar aquele papo intelectualizado e pequenas correntes elétricas começam a percorrer meu corpo em direção à minha pele. Mas nesse dia eu era um Fiat 147 a álcool tentando dar partida em uma manhã gelada. Eu não conseguia entender!!! Atraente, check! Alto, check! Inteligente, check! Agradável, check! Admirável, check! Flertante, check! QUE MERDA TÁ ACONTECENDO COMIGO?! Oito, sim, eu disse OITO horas de conversa maravilhosa, mais de uma dezena de vodkas de tangerina, muitas cervejas e o moço parte pras investidas mais incisivas. Eu forçava meu corpo em direção ao beijo mas uma força do além o jogava pra trás fazendo com que eu parecesse uma daquelas cenas clássicas de desenho animado que o personagem treme de tanta força que faz pra dar um beijo. Ele dizia “mas eu te amei…” e eu pensava “o hotel onde eu beijei o ex pela primeira vez está do outro lado dessa avenida, no Google Maps os marcadores ficariam inclicáveis!”. Propus que caminhássemos mais um pouco e acabamos na porta da delegacia. Um cenário ideal pra que pessoas como eu e ele se beijassem pela primeira vez. Arranquei toda força do meu ser e beijei. Beijei outra vez. Beijei mais uma e fiquei exausta. Eu conscientemente queria beijá-lo e deixar-me explodir em desejo de pele na pele, de querer a barba dele esfregando por todo meu corpo, de deixar aquela noite gelada cheia de calor e suor. Mas por dentro aquilo tudo parecia absurdamente errado e desconfortável. “Não consigo, desculpa… Vamo meiar o taxi?”. Mais um beijo na porta de casa e “boa noite”. Primeiras vezes são mais difíceis do que eu esperava.

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